Super Bowl
114,4 milhões de espetadores televisivos. Mais de 10 mil milhões de dólares em receitas cada época. Mais de 68 mil espetadores por jogo. Cerca de quatro horas de emissão televisiva. Este é o Super Bowl.
«Em poucas palavras: o que é o Super Bowl? Simplesmente a aposta mais segura da indústria da comunicação». O Super Bowl é o evento desportivo de referência nos EUA. Mas o que o fez tornar-se um sucesso ao ponto de virar feriado não oficial?
Ao combinar os media com os desportos de massas e o entretenimento, o Super Bowl tornou-se num verdadeiro império mediático.
O jogo foi criado a partir de um acordo de fusão entre a National Football League (NFL) e a American Football League (AFL). As equipas campeãs de cada liga jogariam uma contra a outra no AFL–NFL World Championship Game até se dar a fusão em 1970.
Após a fusão oficial, cada liga foi renomeada por «conferência», e o jogo tem sido jogado, desde aí, entre as equipas campeãs de cada conferência, para determinar o campeão da liga NFL.
Até agora, a National Football Conference (NFC) lidera a liga com 26 vitórias, enquanto a American Football Conference (AFC) detém 23 vitórias.
O campeão das competições
Nos seus primeiros oito anos, o Super Bowl ultrapassou o Kentucky Derby, um evento com mais de 100 anos, e a World Series, cuja existência remonta a 70 anos. Torna-se, assim no espetáculo de desporto número 1 dos EUA.
Chamado de Super Bowl Sunday, este jogo é o dia de maior consumo alimentar nos EUA. Em primeiro lugar encontra-se o feriado Thanksgiving (Dia de Ação de Graças).
Enquanto grande espetáculo que é, o Super Bowl é o evento mais visto em toda a televisão norte-americana, batendo recordes todos os anos. Só em 2015, o Super Bowl XLIX deteve uma audiência de 114,4 milhões de espetadores. Apesar de a UEFA Champions League obter o maior número de audiências, só ultrapassa o Super Bowl por uma pequena margem.
Devido aos grandes números de telespetadores, o tempo publicitário durante o Super Bowl é o mais caro do ano, chegando a ultrapassar o preço da publicidade na cerimónia dos Óscares da Academia.
Em 2015, um anúncio no intervalo do Super Bowl custava 4.5 milhões de dólares por 30 segundos de exposição. Uma quantia que aumenta todos os anos. Por exemplo, em 1967, no primeiro jogo de sempre, o mesmo espaço de publicidade custava 42 mil dólares.
Todavia, apesar dos números exorbitantes do Super Bowl para os anunciantes, as marcas e as empresas continuam a pagar de bom grado este espaço publicitário.
A verdade é que o Super Bowl não se trata apenas de um evento desportivo. É um espetáculo, que para além de juntar as massas do desporto, já conseguiu apelar multidões pela sua grande aposta no entretenimento. Durante o intervalo que marca a metade do evento – o conhecido halftime show – o Super Bowl convida as maiores celebridades da música para atuarem num espetáculo único.
Destas estrelas incluem-se Michael Jackson, Madonna, Prince, The Rolling Stones, The Who, Whitney Houston, entre muitos outros.
Esta grande cerimónia celebra a ligação do evento à cultura pop, igualmente numa tentativa de atrair uma maior audiência televisiva de espetadores. Tal como no jogo em si, o espetáculo foi visto por cerca de 118,5 milhões de espetadores em 2015.
Um dos espetáculos que ganhou mais atenção mediática foi, sem dúvida, o do Super Bowl XXXVIII, em 2004. Justin Timberlake e Janet Jackson atuavam durante o intervalo do jogo quando o inesperado aconteceu. Numa proeza mal calculada, Timberlake retira parte da roupa de Jackson e muito mais é revelado do que o sutiã da cantora.
Ainda que o incidente tenha sido transmitido pela CBS em menos de um segundo, a controvérsia ficou instalada. A Federal Communications Comission (FCC) multou a CBS em 550 mil dólares, um recorde nunca antes atingido.
Depressa a discussão sobre a indecência na televisão e a censura foi trazida ao de cima. Enquanto uns defendiam a ação da FCC, outros ridicularizavam o incidente e não lhe atribuíam importância. O aparato foi tanto, que o incidente foi denominado de «Nipplegate». O processo foi a tribunal, tendo sido anulado só em 2011.
Estima-se que 70 % dos norte-americanos sejam fãs de futebol americano, e que metade dessa percentagem constitui os verdadeiros fanáticos da modalidade. Em média, estes adeptos dedicam mais de nove horas semanais à NFL, para além de levarem o desporto muito a sério. Trocando por miúdos: o Super Bowl é um produto blockbuster que qualquer marca ou produtora deseja.
Podemos perguntar-nos qual a chave de todo este sucesso e como a NFL tem crescido ao longo dos anos. Imagine a dimensão do evento que é o Super Bowl. Lotação esgotada, multidões em euforia, adultos, crianças, jovens, idosos… Todo este aparato acompanha uma grande logística atrás do evento.
A NFL escolhe antecipadamente qual a cidade que irá receber cada jogo, e uma panóplia de eventos e atividades patrocinadas toma conta do espaço 10 dias antes do domingo de jogo, atraindo turistas, adeptos e locais. Portanto, um evento muito para além do jogo em si.
Nos dias antecedentes ao dia do jogo, as cidades-sede do Super Bowl tornam-se um paraíso para as empresas e marcas, ávidas por promover e vender os seus produtos.
Nesta poderosa dependência entre as marcas e a NFL, a liga norte-americana é tudo menos inocente. Sistematicamente acusada de fazer os pedidos mais extravagantes às cidades-sede, a NFL força o governo a pagar todos os custos envolvidos na logística do evento, para além da construção e reforma dos estádios particulares.
Em troca, a liga de futebol americano promete benefícios económicos superiores a 600 milhões de dólares para a cidade-sede. Talvez a atração mais flagrante de todo o aparato mediático à volta do Super Bowl seja o Media Day.
Dias antes do grande jogo de domingo, a NFL realiza o Media Day, sempre patrocinado por uma marca, destinado para os jornalistas… e não só. Bilhetes são vendidos aos adeptos para assistirem ao evento, ou seja, paga-se uma quantia para se verem os jornalistas a trabalhar.
Neste dia, os órgãos de comunicação social estão todos presentes, onde lhes são concedidas entrevistas com os jogadores. Os adeptos assistem a todo o tumulto, e são-lhes ainda entregues brindes e prémios, alimentando ainda mais o ciclo da poderosa máquina atrás da NFL e do Super Bowl.
Os percalços do branding
No entanto, nem tudo são rosas nesta indústria do desporto, e a NFL já teve a sua dose de crises de branding. Em 2014, a liga viu a sua popularidade baixar devido a uma série de escândalos envolvendo muitos dos seus jogadores.
A 15 de fevereiro de 2014, Ray Rice vê-se envolvido numa discussão com a sua noiva em Atlantic City, que escalou rapidamente para uma agressão. Quatro dias depois, a TMZ revela um vídeo de segurança que captou a cena: o jogador da NFL agride Janay Palmer com um único murro, deixando-a inconsciente no chão. Os media entraram num frenesim. Durante meses o caso foi largamente discutido.
Entretanto, a NFL anuncia que o jogador é suspenso por dois jogos. As pesadas críticas não demoraram a chegar.
Roger Goodell, comissário da liga, foi atacado em todos os ângulos, assim como o papel da NFL durante todo o processo. Nas redes sociais, a organização UltraViolet, que protege os direitos das mulheres e defende a igualdade de géneros, chegou a criar a hashtag #Goodellmustgo.
A 28 de agosto, a NFL divulga uma nova política mais rígida para violência doméstica e outro tipo de conduta violenta.
Apesar de Janay Palmer defender o jogador durante uma conferência de imprensa e de Ray Rice ter emitido um pedido de desculpas, a opinião pública não esqueceria este episódio.
No mesmo ano, apenas meses depois do escândalo de Ray Rice, outro jogador da NFL, Adrian Peterson, é acusado de violência doméstica contra o filho.
O alegado incidente teria ocorrido em maio, mas o jogador só se entregou às autoridades a 13 de setembro. Supostamente, a NFL já teria sabido do sucedido há algum tempo, o que voltou a levantar ondas contra as ações da liga e do seu comissionário, Roger Goodell.
Apesar de Janay Palmer defender o jogador durante uma conferência de imprensa e de Ray Rice ter emitido um pedido de desculpas, a opinião pública não esqueceria este episódio.
No mesmo ano, apenas meses depois do escândalo de Ray Rice, outro jogador da NFL, Adrian Peterson, é acusado de violência doméstica contra o filho.
O alegado incidente teria ocorrido em maio, mas o jogador só se entregou às autoridades a 13 de setembro. Supostamente, a NFL já teria sabido do sucedido há algum tempo, o que voltou a levantar ondas contra as ações da liga e do seu comissionário, Roger Goodell.
Em média, quase 30 jogadores são presos por temporada, por crimes que variam entre a condução sob o efeito de álcool ou drogas, agressão, assassínio e até falsa ameaça de bomba.
Ray Rice e Adrian Peterson foram apenas dois exemplos que levaram ao cancelamento de contratos milionários de patrocínio.
Sejam bons ou maus motivos, a NFL faz sempre capa nos jornais norte-americanos. E apesar de todos os escândalos e algumas campanhas de ódio contra certos atletas polémicos, a NFL acaba sempre por ganhar uma enorme visibilidade no contexto mediático. Consensual ou controversa, a liga americana manter-se-á na ribalta.
A NFL ganhou o seu lugar de destaque na cena mediática com o grande jogo que finaliza as temporadas do futebol americano. Este sucesso deve-se, em parte, à imensa popularidade da modalidade nos EUA, e às multidões que esta arrasta consigo. Contudo, a aposta da NFL no entretenimento e nos media, englobando um verdadeiro recinto de atividades apelativas que constrói uma efervescente antecipação ao jogo de domingo, fez deste evento um dos mais rentáveis de sempre.
Atraindo uma nação inteira e criando uma capacidade muito própria de fusão entre media, empresas, marcas, fãs, adeptos e celebridades, o Super Bowl tornou-se um autêntico fenómeno.