Carlos Pinhão

Apesar dos três anos que frequenta no curso de Direito da Universidade de Lisboa, Carlos Pinhão decide-se a enveredar pelos Media. Enquanto jornalista passa pelas redações do Mundo Desportivo, Diário Popular, Século Ilustrado, Público e, sobretudo, A Bola

A Febre do Futebol

A 22 de abril de 1962, Carlos Pinhão testemunhou o primeiro golo de Eusébio ao FCP Porto, numa partida que antecedeu o jogo da final da Taça dos Campeões Europeus entre o Benfica e o Real Madrid.

Carlos Pinhão antecipando o que mais tarde veio a verificar-se escreveu, no dia seguinte, n’A Bola acerca do golo de Eusébio: «(…) como se se tratasse já de um golo… ao Real Madrid».

Sobre este mesmo derby Pinhão, que conduz palavras, acrescentou: «Exibição já em nível aproximado ao dos seus melhores jogos do princípio da época, faltando-lhe apenas felicidade no remate. Tanto procurou o golo, sem complexos de qualquer espécie, perante os sucessivos malogros, que viria a alcançá-lo.»

Carlos Pinhão jornalista e homem das letras nasceu a 4 de maio de 1924 em Lisboa. A par do Desporto, a cidade de Lisboa e a literatura eram outras das suas paixões.

 

 

A par do jornalismo, o humor, a poesia e a literatura infantil foram áreas por onde Pinhão também espraiou o seu génio criador.

Enquanto jornalista passou, em Portugal, pelas redações do Mundo Desportivo, do Diário Popular, do Século Ilustrado, do Público e d’A Bola. Em Espanha marcou presença na redação do Marca,  em França colaborou com o France Soir e na Bélgica com o Les Sports.

Por cá, escreveu também, ainda que pontualmente, para o Diário de Lisboa e Jornal do Fundão. De mão dada com a literatura foi responsável pela introdução do conto e da crónica no jornalismo desportivo.

 

 

A despesona!

Antes de chegar à A Bola, Carlos Pinhão passou pelo Mundo Desportivo onde viveu episódios de tensão com o então diretor, Dr. José Gonçalves.

Um desses momentos teve que ver com despesas de deslocação e representação de Carlos Pinhão numa competição desportiva europeia.

Pinhão, deslocou-se para um determinado país europeu e ficou alojado num humilde hotel. Quando o campeonato terminou,  ligou para a redação e transmitiu o resultado dos participantes, do primeiro até ao sexto lugar, para sair na edição do dia seguinte.

Tendo em conta que as comunicações internacionais nas décadas de 50 e 60 eram caras e morosas e, até, consideradas um luxo Carlos Pinhão foi chamado ao gabinete do Dr. José Gonçalves para explicar os «gastos».

 

 

Dr. José Gonçalves, furibundo pregou-lhe uma valente descompostura afirmando «que parecia impossível», que ele tinha andado a «desbaratar o dinheiro do jornal«, que tinha «gasto um dinheirão em comboios, hotéis, comes e bebes, mais a linha telefónica» – e, depois desta “despesona” enorme, apenas tinha «comunicado os resultados... até ao sexto classificado! Um escândalo!»

Carlos Pinhão observou, baixinho: «Ó senhor doutor, desculpe, mas eu não podia indicar mais do que os seis primeiros... porque eram apenas seis a concorrer...».

O diretor ficou envergonhado, sem resposta e, de imediato, mandou Pinhão sair do gabinete.

 

«A Tarde Vermelha»

De volta à Bola, no dia 20 de novembro de 1978 pôde ler-se na capa «A Tarde Vermelha» assinalando a vitória do Benfica sob o Sporting por 5-0, no dia anterior.

Na verdade, o título  de Carlos Pinhão dizia mais que isso e se lêssemos as entrelinhas uma nova tese podia ser descoberta.

O título completo era «Tarde Vermelha com Eanes a assistir». Nesta data vivia-se o período do PREC (Período Revolucionário em Curso) e no mesmo dia do jogo, o Partido Comunista Português (PCP) tinha ganho mais um ponto, ou melhor dizendo, a Câmara Municipal de Évora. Pinhão, militante do PCP, celebrou assim, com aquele título, duas vitórias – uma desportiva e outra política.

 

 

 

 

Carlos Pinhão foi também responsável pela introdução do humor, da crónica, e do conto no jornalismo desportivo, tendo o convidado, semanalmente, um escritor de Língua Portuguesa para escrever n’A Bola. Além de uma vocação cultural, houve igualmente uma vocação comercial, credibilizando A Bola e tornando-a numa das publicações mais desejadas do mercado. Consequentemente, esta publicação passou a ser chamada de Bíblia do desporto.

Um dos textos de humor de Carlos Pinhão tinha o título de «Ataíde, Procura-se» e contava um episódio caricato entre um cliente e um ex-cliente da Companhia dos Telefones.

A história era a seguinte: 

 

 

Carlos Pinhão, responsável também pela «Hoje Jogo Eu», uma das rubricas mais antigas d’A Bola, escreveu em jeito de crónica de viagem os acontecimentos desportivos dos vários cantos do mundo. Após a queda do Antigo Regime, os jornalistas à semelhança de Carlos Pinhão tiveram a missão de reaprender a escrever livremente, longe das entrelinhas. Num dia, na década de 80, podia ler-se nesta rúbrica:

«Repórter teve entrada no Jardim Botânico de Glasgow (digamos JBG), porque a entrada só é proibida a cães e a crianças com menos de dez anos, de onde se conclui que só aos dez anos uma criança fica acima de cão, é proverbial o carinho que os ingleses dedicam aos cães. (…) Evidentemente, na minha qualidade de lisboeta bairrista, não me conformei e perguntei ao guarda do JBG: (…) – “Mangericous alfacinatus?” – Não entendo! – disse ele em inglês. (…) Não insisti, já tinha percebido que manjericos não havia, não nos ligam nenhuma.»

Carlos Pinhão morreu a 15 de janeiro de 1993 e  foi um dos mais notáveis jornalistas desportivos portugueses, aliando uma qualidade literária e um sentido pedagógico nas suas crónicas.

Paralelamente ao jornalismo Carlos Pinhão publicou várias obras literárias dedicadas ao público infantil-juvenil.