Eduardo Coelho

Em 1864, Portugal assiste às consequências da Revolução Industrial ao mesmo tempo que o Jornalismo começa a florescer. Neste ano surge, pelas mãos de Eduardo Coelho, o Diário de Notícias - primeiro periódico popular industrial

A industrialização chega à Imprensa

O ano era 1834. O triunfo dos liberais na Guerra Civil permitiu a promulgação de uma nova Lei da Liberdade de Imprensa. A interferência do poder político no jornalismo passava a ser vista com algum desdém, e a isenção de medidas preventivas começava a ser garantida. Aos jornais já consolidados, de teor elitista e partidário, começaram a juntar-se os periódicos político-noticiosos e populares. A imprensa em Portugal reflorescia.

Em 1864, o Diário de Notícias(DN) surgia como primeiro periódico popular industrial, nas mãos de Eduardo Coelho e Tomás Quintino Antunes. Assistia-se à chegada da Revolução Industrial a Portugal.

 

Da Tipografia para a secretária de uma redação

Foi este o país em que José Eduardo Coelho, o futuro diretor do Diário de Notícias, nasceu, a 23 de abril de 1835. Órfão de pai aos 13 anos, foi enviado para Lisboa pela mãe, para trabalhar na área do comércio. Em 1852, publicou o Livrinho dos Caixeiros, uma coleção de quadras de caráter reivindicativo e denunciante.

 

 

Dois anos depois, pagou pela publicação do romance O Pastor da Floresta no periódico Jardim Literário. Foi assim que se despediu do comércio, passando a aprender a arte da tipografia, ajudando a compor, gratuitamente, o jornal Jardim Literário. Tal permitiu-lhe continuar a publicar textos nesse periódico, onde acabou por obter emprego como tipógrafo. Em 1857, concorreu a um lugar desta profissão na Imprensa Nacional obtendo a vaga, mas abandonaria o lugar menos de um ano depois. Por esta altura, a ideia de lançar um jornal noticioso começou a germinar na cabeça de Eduardo Coelho.

Eduardo Coelho passava a subsistir da colaboração nos jornais O Conservador, o Gazeta de Portugal e o Revolução de Setembro enquanto noticiarista, editor de correspondência dos leitores e de matérias de correspondentes da província.

Além do jornalismo, vivia ainda da assessoria política, sendo secretário dos políticos José Estêvão (figura dominante da oposição de esquerda na Câmara dos Deputados) e António Feliciano de Castilho (grande propagandista do seu Método de Castilho para a leitura).

Inserido no mundo do jornalismo e da política, Eduardo Coelho permaneceu, ainda assim, partidariamente neutro. Escrevia essencialmente notícias ou críticas de teatro, para além de folhetins, e não artigos de fundo. Viajou também por Portugal, Espanha, França e outros países europeus, onde teve contacto com outros periódicos, como o Petit Journal em que mais tarde se basearia para fundar o DN.

 

 

O nascimento do Diário de Notícias

A 29 de dezembro de 1864, o primeiro número do Diário de Notícias começou a circular. Nascia um jornal diferente de todos os outros em Portugal, tanto nos conteúdos, como no seu estilo claro, conciso, preciso e simples.  Até a sua forma e dimensão se destacavam dos demais, e, especialmente, o seu preço: o mais barato no mercado.

Na primeira página do novo periódico podia ler-se:

«O Diário de Notícias − o seu título o está dizendo − será uma compilação cuidadosa de todas as notícias do dia, de todos os países, e de todas as especialidades, um noticiário universal. Em estilo fácil, e com a maior concisão, informará o leitor de todas as ocorrências interessantes (…) Eliminando o artigo de fundo, não discute política, nem sustenta polémica».

 

 

O objetivo era óbvio: fornecer uma nova perspetiva do jornalismo noticioso, informativo e generalista, que se propunha ser neutro, ético, independente e o mais verdadeiro possível. Dirigido a toda a população e encarado essencialmente como negócio.

A redação, instalada na Rua dos Calafates, no Bairro Alto, seria a primeira a ter um posto privativo de telegrafia sem fios.

Em meados do século XIX, o bairro passava por uma transformação. Rapidamente se convertia num meandro de tipógrafos e redações de jornais, onde se situava igualmente a Tipografia Universal, da qual Tomás Quintino Antunes era proprietário. A parceria entre Antunes e Eduardo Coelho estava formada, e a impressão e sobrevivência do Diário de Notícias assegurada. Anos mais tarde, em 1885, a rua faria homenagem ao diário, tal não foi o seu contributo para o jornalismo português.

 

 

O DN, lido pela população e até pela Família Real, garantiu desde logo o seu imenso sucesso. Com uma tiragem inicial de cinco mil exemplares, passados cinco anos já tirava 17 mil. Em 1885, tirava já 26 mil exemplares diários e apresentava-se perante o público com mais conteúdos e mais anúncios. 

Outra particularidade que o novo diário introduzia era a implementação de um sistema organizado de recolha de informações para o noticiário, através de uma rede de informadores que se estendia a vários correspondentes espalhados pelo país, no Brasil e em Espanha. Além disso, contava com o telégrafo, as agências noticiosas e os caminhos de ferro para obter informação de todo o lado.

 

A Notoriedade

No entanto, o início do jornal não foi feito apenas de sucesso. O jornalismo pioneiro do DN chocava com a sociedade oitocentista, particularmente as elites, que acusavam o diário de um «jornalismo decadente», ao prestar atenção ao crime, a trivialidades sociais e a outros assuntos do quotidiano das pessoas. Apesar de alguns obstáculos, o Diário de Notícias conseguiu vingar e prosperar.  Aliás, o seu preço baixo deu origem a uma explosão do número de ardinas.

 

 

Na verdade, o diário ganhou notoriedade e revolucionou o jornalismo em Portugal devido a muitas inovações, como a introdução das reportagens e o aparecimento de espaços virados para o leitor, a publicação de números especiais e a criação de uma secção de anúncios a baixo preço. Além disso, tornou-se o primeiro jornal a fazer páginas intensamente ilustradas, como é o exemplo da primeira página dedicada ao Carnaval, da autoria do artista Rafael Bordallo Pinheiro, publicada a 26 de fevereiro de 1895.

 

 

O jornal prosperava à conta das ações extraordinariamente pensadas e calculadas de Eduardo Coelho. Um desses exemplos passa igualmente pela publicação do folhetim «O Mistério da Estrada de Sintra», assinado por Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão.

 

Eduardo Coelho seria diretor do Diário de Notícias até à sua morte, a 14 de maio de 1889. Grande fundador da história da imprensa portuguesa influenciaria O Comércio do Porto e O Primeiro de Janeiro, os jornais de referência no Norte do país. A par destes, destacam-se os nomes de Silva Graça e Pereira da Rosa, personalidades atrás d’O Século, que seguiria igualmente a linha editorial do DN.

 

 

Eduardo Coelho ficaria para sempre conotado como um empreendedor dos media e do jornalismo na sociedade portuguesa oitocentista. A Avenida da Liberdade em Lisboa é o palco do legado que este fundador deixou na imprensa portuguesa.