Storytelling: contar estórias que vendem

Do Capuchinho Vermelho ao Water Project. A disciplina de contar estórias que vendem nas ferramentas da Comunicação.

Era uma vez…

Nos anos 50, uma estudante universitária entrega o seu filho a um casal da classe trabalhadora.

O jovem entra numa universidade privada que não consegue pagar e acaba por desistir dos estudos.

Integra uma incipiente empresa tecnológica, de onde é despedido.

Regressa, anos depois, e transforma-a numa potência mundial.

A narrativa parece pertencer a um herói de contos de fadas. Não falta nenhum ingrediente: coragem, sofrimento, amor e dedicação.

Trata-se, na verdade, da estória bem real de Steve Jobs, cofundador da Apple.

Uma narrativa que se confunde com a própria marca e integra a sua estratégia de comunicação.

 

 

O caso da Apple ilustra a importância das estórias para as Relações Públicas.

O storytelling enquanto estratégia comunicacional nasce a partir de um desejo básico e comum a todos os seres humanos: a vontade de serem conquistados.

Do Neolítico à propagação do @

“Scratch the surface in a typical boardroom and we’re all just cavemen with briefcases, hungry for a wise person to tell us stories.”

[«Debaixo da superfície, numa típica sala de reuniões, somos todos homens das cavernas com pastas, desejosos que uma pessoa sábia nos conte estórias».]

Alan Kay, Vice-Presidente da Walt Disney

A arte de contar estórias é tão antiga quanto a Humanidade.

Mesmo antes do desenvolvimento da escrita, o ser humano descobria o poder da narrativa para reter e consolidar o seu conhecimento.

As estórias permitiam aos nossos antepassados transmitir informação e fortalecer os laços comunitários.

Em pleno século XXI, as estórias continuam a ser parte central da Comunicação.

As estórias das RP

“People do not buy goods and services. They buy relations, stories and magic.”

[«As pessoas não compram bens e serviços. Compram relações, estórias e magia».]

- Seth Godin, especialista de Marketing

Uma marca é uma questão de perceção: como esta se vê e como esta pretende ser vista pelos seus públicos são questões-chave para a constituição da sua identidade.

Trabalhar estrategicamente uma marca deve passar por criar uma experiência que tenha impacto nos públicos.

Uma criação feita, direta ou indiretamente, a partir de estórias.

As narrativas conferem personalidade à marca e permitem-lhe chegar de forma mais eficaz e duradoura aos públicos.

O segredo? Conferir um contexto e desenvolver uma estória, de forma que o público atribua significados emocionais à marca.

Mais do que uma campanha ocasional, o storytellingdeve orientar a estratégia da empresa de forma consistente e adaptar-se de acordo com a resposta do público.

Uma lição que a Dove estudou bem.

A marca tem vindo a investir fortemente na sua comunicação, desenvolvendo uma estratégia baseada no conceito de “Real Beauty”.

 

 

Esta ideia é transmitida através de vários meios, desde vídeos a billboards, de ações nas redes sociais a anúncios virais.

Em comum, as peças divulgadas através das plataformas de comunicação têm o facto de não procurarem vender um produto ou serviço específico, mas sim divulgar um conceito: “Real Beauty”.

Em busca de uma narrativa

“Stories give color to black and white information.”

[«As estórias dão cor à informação a preto e branco».]

 - Todd Stocker, autor

Ao dar à marca uma identidade, capturando e partilhando estórias, é possível proporcionar aos consumidores uma experiência que estes desejam vivenciar.

De forma a que o público desenvolva uma ligação pessoal com a marca, as estórias devem ser autênticas, criativas e inspiradoras.

Dos conteúdos aos eventos e às campanhas, toda a estratégia deve estar inserida numa grande narrativa, que fundamente e apoie a identidade da marca.

Tal como um conto de fadas, estas estórias devem ter um início, criar um conflito e chegar a uma resolução.

No entanto, as narrativas empresarias são únicas porque requerem um quarto elemento: um call to action, ainda que, muitas vezes, indireto.

Em Relações Públicas, um final feliz não passa pela compra de produtos ou serviços, mas pela forma como a narrativa consegue inspirar, motivar a mudança e aumentar o engagement: criar a identidade e formar a perceção sobre determinada organização, entidade, empresa, marca ou produto.

Veja-se o exemplo da campanha “Stay Together”, desenvolvida pelo Skype.

A marca convidou os utilizadores a partilhar as suas estórias reais, criando uma nativa apelativa e pungente, que recorre à estrutura básica dos contos de fadas, deixando os espetadores a torcer pelo sucesso do herói.

A história do “retrato impossível”, que junta um homem que fugiu da guerra e a família que deixou para trás, conquistou os internautas.

 

 

Escutar o público é, aliás, uma das lições fundamentais para ser um bom contador de estórias, pois só dessa forma é possível entender verdadeiramente os seus desejos e preocupações, as suas crenças e atitudes.

Um trabalho contínuo, que se prolonga ao longo da campanha, de forma a avaliar as reações dos consumidores.

À medida que os objetivos se alteram, devem ser planeadas novas iniciativas que deem continuidade à estória e inspirem novos calls of action.

A Coca-Cola é um exemplo de longevidade na utilização de técnicas de storytelling.

O recurso a narrativas para a construção da identidade da marca faz parte do ADN da multinacional.

Entre os seus maiores feitos comunicacionais encontra-se, aliás, a criação da figura do Pai Natal que hoje conhecemos e que já integra a cultura popular.

É este um dos top goalsde qualquer organização: uma estória criada por uma marca ficou gravada de forma tão profunda que se tornou parte do imaginário comum da sociedade.

 

 

No seu plano estratégico, a marca propõe-se a alcançar um “disproportinate share of popular culture” [«sharedesproporcional da cultura popular»], criando conteúdos virais, cuja disseminação não pode ser controlada.

Grande parte dos seus conteúdos surge a partir do conceito “Coke Side of Life”, associado à ideia de felicidade.

Além das suas campanhas globais, a marca procura chegar mais perto dos consumidores, desenvolvendo iniciativas de comunicação adaptadas aos diferentes mercados.

A iniciativa “Small World Machines” uniu Índia e Paquistão, nações separadas por disputas territoriais e por décadas de conflitos, numa campanha que trouxe o público para o centro da estória; mais do que a própria marca, foram os paquistaneses e os indianos os protagonistas.

 

 

 

Protagonista: o público

“Content builds trust. Trust builds relationships.”

[“Conteúdos constroem confiança. Confiança constrói relações”.]

 - Andrew Davis, autor

Tal como os contos de fadas, o storytelling é, por definição, uma técnica centrada na pessoa.

Embora seja importante para as marcas contar a sua própria estória, são as narrativas criadas pelos consumidores que têm um impacto maior.

Os consumidores devem ser o protagonista, com a empresa a servir como personagem secundária, que disponibiliza ferramentas para decisões informadas.

O sucesso reside na criação de estórias atrativas que têm o poder de mobilizar o público.

Por este motivo, é um dos pilares comunicativos das organizaçoes não-governamentais, que utilizam narrativas com o objetivo de conquistar awarenesspara a sua causa.

O que acontece quando a crise da falta de água em África chega a um cinema em Hollywood?

O The Water Project procurou dar resposta a esta questão, desenvolvendo uma campanha que torna o público num dos protagonistas ativos.

 

 

Em vez de anunciar factos e números, o projeto procurou levar os espetadores a integrar as estatísticas, pelo menos durante uns minutos.

O público foi convidado a embarcar numa jornada com o The Water Project, inspirando o sentido de missão e levando-os na jornada da organização, com o objetivo de alargar o acesso a água potável e saneamento básico.

Uma Aldeia Global povoada de estórias

“Social media is about the people. Not about your business.”

[“As redes sociais são dedicadas às pessoas. Não ao seu negócio”.]

- Matt Goulart , fundador da WebStar Content

A utilização de técnicas de storytelling não nasceu com as redes sociais, mas habita nelas.

Devido ao crescimento explosivo destas plataformas e do marketing de conteúdo, contar estórias tornou-se uma prioridade estratégica.

No online, o storytelling assume diferentes especificidades: as redes sociais são vistas como mais do que uma plataforma de distribuição, tornando-se um espaço de conversa entre as marcas e os internautas.

Dos 140 caracteres do Twitter às transmissões em direto no Periscope, cada meio tem a sua característica distintiva, que deverá ser levada em consideração na elaboração da estratégia de marketing.

 

Da narrativa criada pelo Presidente Obama no Twitter às estórias visuais da Starbucks no Instagram, passando pelos vídeos inspiradores da UNICEF no Vine, pelos casos da vida real apresentados pela Make a Wish no Pinterest e pelas publicações narrativas da Nike no Facebook, as redes sociais tornaram-se num palco priveligiado para o storytelling.

Uma técnica que atravessa formatos e que tem como principal propulsor a criatividade.

E viveram felizes para sempre

“Stories are not indicators, they ARE the organization.”

[“As estórias não são indicadores, SÃO a organização”.]

- David M. Boje, especialista em Storytelling

Dos livros infantis aos discursos de líderes mundiais, o stortytelling enquanto ferramenta comunicacional está por todo o lado.

O público pode esquecer nomes e estatísticas, mas não a experiência que a marca lhes proporcionou: as estórias são aquilo que as pessoas recordam.

Estórias que ajudam a interpretar o passado e a construir o futuro de uma marca.

«O Marketing vende produtos. A Publicidade vende imagens. O planeamento vende visualizações. Os eventos vendem momentos. As pessoas compram estórias».