Cáceres Monteiro
Jornalista-viajante, correu mundo e cobriu alguns dos mais marcantes conflitos do seu tempo. Cáceres Monteiro, o repórter que também se sentia em casa na redação, é um dos grandes jornalistas portugueses da segunda metade do século XX
«Eu mordi a maçã, foi decisivo. Apanhei logo ali o bichinho do jornalismo».
Em 1968, era Carlos Cáceres Monteiro um jovem estudante de Direito quando recebe um convite inesperado. Manuel Beça Múrias, chefe de redação da publicação Flama, propunha-lhe que fizesse a cobertura dos Jogos Olímpicos do México.
Cáceres Monteiro, que já tinha colaborado anteriormente com a publicação, estava reticente em aceitar, pois tinha exames de segunda época da faculdade.
Múrias insistiu: «Veja bem, faz os exames noutra altura, vai conhecer o México, para em Nova Iorque, se quiser...».
Cáceres acabou por se render.
Os primeiros artigos
Nascido a 9 de agosto de 1948, em Lisboa, iniciou a sua carreira no jornalismo aos 20 anos, na revista Flama.
Colaborou com diversas publicações, nomeadamente O Século Ilustrado, A Capital, o Diário de Notícias(onde foi editor de política), o semanário Se7ee como correspondente da revista espanhola Cambio 16.
Em 1975, já depois do 25 de abril, integrou um grupo de 15 jornalistas que cofundou o semanário O Jornal, do qual foi diretor adjunto. Na altura, «os acontecimentos eram um tal turbilhão que havia necessidade de explicar a realidade às pessoas», afirmou.
Em 1993, após a extinção d’ O Jornal, nasce a revista Visão.
Cáceres Monteiro foi diretor da publicação até 2005.
Nesse ano, passou a diretor editorial do grupo Edimpresa.
Presidiu ao Sindicato dos Jornalistas entre 1977 e 1981, estando ligado às primeiras leis que regularam o jornalismo depois da ditadura e acompanhando a criação do primeiro curso superior de Comunicação Social, na Universidade Nova de Lisboa.
Entre 1984 e 1985, com Mário Soares como Primeiro-Ministro, tornou-se diretor-geral da Comunicação Social.
Também se destacou enquanto analista político, colaborando com regularidade com a RTP, a SIC Notícias, a TSF e a Antena 1.
O jornalista-viajante
Um dos seus mais reconhecidos contributos para o mundo do jornalismo foi através do seu trabalho enquanto repórter, que o levou a viajar por todo o mundo.
Da América do Sul à China, do Médio Oriente aos Estados Unidos, Cáceres Monteiro tornou-se um dos mais viajados repórteres do jornalismo português. «A emoção começa quando se desce a escada do avião ou quando o barco encosta ao cais», escreveu.
Enviado especial por excelência, Cáceres Monteiro destacou-se no jornalismo de informação e na reportagem de guerra.
Em 1975, foi enviado para Angola para cobrir o conflito do país.
«Quando os soldados do MPLA marcham, com as grandes botas cardadas, no asfalto escaldante das ruas quase desertas, o batimento ressoa na espessura do silêncio, a herança deixada por centenas de milhares de portugueses».
As balas não mais abandonariam a sua carreira.
Em 1991, o também jornalista Adelino Gomes deu-lhe «boleia para a Guerra [do Golfo]», com a cumplicidade de um capitão seu «amigo». Foram os primeiros jornalistas portugueses a chegar a Koweit City.
Enquanto repórter de guerra, cobriu ainda os conflitos de Israel e Palestina, da América Latina e do Camboja.
As suas reportagens sobre a China valeram-lhe, em 1985, o Prémio Gazeta do Clube de Jornalistas. Foi ainda distinguido com o Grande Prémio de Jornalismo de 2001 pelo Clube Português de Imprensa.
Apesar de ter corrido mundo enquanto repórter, Cáceres Monteiro sentia-se em casa na redação.
«Antes de mais sou um jornalista de banca, gosto da chefia e de fazer sair as edições», admitiu.
O mundo em memórias
As aventuras de Cáceres Monteiro por todo o mundo foram imortalizadas nos seus livros.
Enquanto autor único ou em colaboração, Cáceres Monteiro publicou um total de nove obras.
Angola, país de vida ou de morte (1975), Fast Lane (1984), O mundo em AZERT (1985), China, Contra-revolução Tranquila (1986), Amazónia Proibida (1987) e Apogeu e queda de Bernardo Malaquias (1989) são alguns dos livros com a sua assinatura.
Destaque ainda para O Enviado especial(1991), Mistérios da Amazónia - cadernos de uma expedição nas Guianas e no Brasil(2002) e Hotel Babilónia (2004).
Cáceres Monteiro faleceu a 3 de janeiro de 2006, depois de uma carreira de quase quatro décadas no jornalismo, uma atividade que via como mais do que apenas uma profissão.
«Acredito na humanidade e no jornalismo como missão de vida. Com todos os erros, acho que, se exercermos bem a nossa profissão, podemos lutar por boas causas».
O Prémio de Reportagem Cáceres Monteiro, que distingue os melhores trabalhos produzidos no Grupo Impresa, foi batizado em sua homenagem.
O nome de Cáceres Monteiro foi também atribuído a uma avenida em Miraflores, na freguesia de Algés, onde o jornalista e escritor residiu mais de três décadas.
Um verdadeiro «repórter-viajante-aventureiro», Cáceres Monteiro consagrou-se como um dos grandes jornalistas portugueses da segunda metade do século XX.
Figura exemplar da reportagem de viagens, a sua vocação de enviado especial levou-o aos quatro cantos do mundo, acompanhando os acontecimentos internacionais de maior relevo das últimas décadas.
«A melhor sensação que um jornalista pode ter é sentir que está a viver, par a par, com a história do seu tempo». Uma história que, através das suas reportagens, Cáceres Monteiro ajudou a contar.