PAQUETE DE OLIVEIRA

(1936 – 2016)

“Fisicamente, morre-se uma única vez; socialmente, podemos morrer e nascer várias vezes”. Era o próprio Paquete de Oliveira quem o afirmava, assumindo a sua multifacetada trajetória, ou seja, os seus múltiplos e «diversificados caminhos».

Uma evocação a Paquete de Oliveira com testemunhos de Gustavo Cardoso, José Rebelo, Céu Neves, António Firmino Costa e José Jorge Barreiros.

Professor, investigador, sociólogo e sempre amigo, Paquete de Oliveira era um Homem com quem dava gosto conversar, mesmo quando havia divergências. É, pelo menos, assim que o recordam alguns dos muitos que com ele se cruzaram (“nunca o vi zangar-se, era incapaz de levantar a voz” – diz José Rebelo, seu amigo e companheiro de lides académicas), enquanto evocam os diferentes percursos da sua vida: o de padre, o de jornalista, o de sociólogo, o de investigador e o de professor.

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Paquete de Oliveira. ©Bruno Simões Castanheira/JN

Paquete de Oliveira. ©Bruno Simões Castanheira/JN

DO SEMINÁRIO PARA AS CIÊNCIAS SOCIAIS

José Manuel Paquete de Oliveira nasceu em 1936, no Funchal (Madeira), e morreu em Lisboa, no dia 11 de Junho de 2016. Foi ordenado padre em 1960, depois de ter frequentado o Seminário do Funchal, onde foi professor e responsável pela área da Educação.

Foi, na ocasião, membro da direção do Clube Desportivo Nacional (o Nacional da Madeira), tendo, inclusive, dirigido o boletim então editado pelo clube e integrado, em 2010, a comissão de honra comemorativa do centenário.

Apaixonado desde cedo pelo Jornalismo (aos 23 anos, já padre, foi chefe de redação do Jornal da Madeira, um diário, então, ligado à diocese do Funchal) e, mais tarde, pela Sociologia, licenciou-se em 1973, em Ciências Sociais (ramo da Sociologia) na Faculdade de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.

Após a revolução de 25 de Abril, já desvinculado do sacerdócio, dirigiu o Diário de Notícias (da Madeira) e integrou a Junta de Planeamento, órgão de gestão governativa do Arquipélago até à criação das novas estruturas democráticas.

Em 1976, é convidado, por Adérito Sedas Nunes, a lecionar a disciplina de Sociologia da Comunicação no ISCTE – Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (hoje, ISCTE – IUL-Instituto Universitário de Lisboa), no curso que apenas viria a ser reconhecido no ano seguinte, já que, mercê da oposição reiterada do Estado Novo, “a sociologia portuguesa”, como escreveu Madureira Pinto, só começou verdadeiramente” depois de Abril de 74

Ao ISCTE, Paquete de Oliveira dedicou a vida, a ponto de, segundo José Rebelo, essa docência ter marcado a sua própria identidade. Com a importante curiosidade de, na opinião de Céu Neves, jornalista que foi sua aluna e mãe dos seus dois filhos, à prática do jornalismo, ter associado a prática do estudioso e a prática da investigação.

Recorda, a propósito, que, logo no primeiro dia de aulas, «o José Manuel identificava todos os alunos pelo nome», porque, como o viria a “constatar mais tarde”, antes de iniciar o ano letivo, lia atentamente o currículo de cada aluno, debruçando-se particularmente sobre as fotos.

Foi ainda no ISCTE que se doutorou (1988), com uma tese que, sob o título de Formas de “Censura Oculta” na Imprensa Escrita em Portugal no Pós 25 de Abril (1974-1987), continua a constituir um documento indispensável ao entendimento das complexas relações dos media com a sociedade – em causa, as «censuras invisíveis». Naquele Instituto, assumiu também importantes cargos científicos e de gestão, tendo integrado, designadamente, o seu Conselho Executivo (1989-2006). Dirigiu, entre 1986 e 1989, Sociologia, Problemas e Práticas, revista de que foi um dos fundadores.

Atento à evolução e inovação da comunicação, criou, cerca de uma década depois, o pioneiro curso de mestrado na área da Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação, onde, segundo António Firmino da Costa, investigador e sociólogo que foi professor catedrático no ISCTE-IUL, «adicionou às vertentes da sociedade, da cultura, da comunicação e do poder a modernidade das novas tecnologias». Com a importante vantagem de, no dizer de alguém, sempre ter pugnado pela abertura da universidade ao mundo e sempre ter recusado a restrição da «investigação à academia».

Lecionou ainda no Instituto Superior de Economia (atual ISEG) e no Centro de Estudos Judiciários. Foi um dos fundadores da SOPCOM, a Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação, criada em 1998, com o objectivo de representar a investigação em Ciências da Comunicação junto do poder político, tendo integrado a sua primeira direcção e sido seu presidente, entre 2002 e 2005. Foi membro do Conselho Consultivo da Comissão Nacional da UNESCO (1999-2002), presidiu, entre 2002 e 2006 à direção da LUSOCOM, a Federação Lusófona de Ciências da Comunicação fundada em 1998, com o objetivo de promover o desenvolvimento de estudos das ciências e políticas da comunicação no espaço lusófono, e ao Conselho Geral da Universidade da Beira Interior.

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No ISEG, em Março de 2011

No ISEG, em Março de 2011

Lecionou ainda no Instituto Superior de Economia (atual ISEG) e no Centro de Estudos Judiciários. Foi um dos fundadores da SOPCOM, a Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação, criada em 1998, com o objectivo de representar a investigação em Ciências da Comunicação junto do poder político, tendo integrado a sua primeira direcção e sido seu presidente, entre 2002 e 2005.

Foi membro do Conselho Consultivo da Comissão Nacional da UNESCO (1999-2002), presidiu, entre 2002 e 2006 à direção da LUSOCOM, a Federação Lusófona de Ciências da Comunicação fundada em 1998, com o objetivo de promover o desenvolvimento de estudos das ciências e políticas da comunicação no espaço lusófono, e ao Conselho Geral da Universidade da Beira Interior.

ENTRE A ACADEMIA E O JORNALISMO

Com a vida especialmente centrada no ensino e na investigação, Paquete de Oliveira nunca abandonou, no entanto, o Jornalismo, tendo sido uma presença regular em jornais como o ExpressoDiário de LisboaDiário de Notícias ou Jornal de Notícias. Foi ainda, entre 1994 e 1997, comentador residente do programa “Casos de Polícia”, transmitido pela SIC.

Como afirma José Jorge Barreiros, que foi seu amigo e companheiro académico, desde sempre, de facto, que se “interessou pelas questões do jornalismo, da comunicação, da informação, das notícias”, ou seja, os media constituíram “um traço marcante” de “todo o seu percurso de vida”.

De sublinhar, ainda, a sua importante intervenção na defesa dos direitos dos espectadores e dos leitores, tendo sido provedor do telespectador da RTP, entre 2006 e 2011 (“Voz do Cidadão”), e, mais tarde, provedor do leitor do jornal Público, cargo que ocupou entre Dezembro de 2013 e o dia da sua morte (11 de Junho de 2016).

Alguns dos que acompanharam mais de perto esta sua atividade consideram que a forma “ponderada” e “refletida” como tratava as mensagens recebidas fizeram com que o seu programa televisivo tivesse atingido uma inesperada audiência. Há mesmo quem, a propósito, considere que ele foi o provedor capaz de ensinar o País a “pensar” a Comunicação.

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Apresentando, na RTP, “Voz do Cidadão”, o programa da responsabilidade do Provedor do Telespectador

Apresentando, na RTP, “Voz do Cidadão”, o programa da responsabilidade do Provedor do Telespectador

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Apresentando, na RTP, “Voz do Cidadão”, o programa da responsabilidade do Provedor do Telespectador

Apresentando, na RTP, “Voz do Cidadão”, o programa da responsabilidade do Provedor do Telespectador

Em 2004, publicou, com Gustavo Cardoso e José Jorge Barreiros, Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação(2004), uma obra que, de acordo com os seus autores, pretendia dar um “contributo” e ser “uma reflexão sobre os impactos e consequências da Internet nos processos de inovação e mudança social que desencadeia”.

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Comunicação e Quotidiano: Textos e Intervenções – 1983-2016

Comunicação e Quotidiano: Textos e Intervenções – 1983-2016

Cerca de um ano depois da sua morte (Outubro de 2017), o ISCTE-IUL promoveu a publicação de um livro, onde, sob o título de Comunicação e Quotidiano: Textos e Intervenções – 1983-2016 (coordenação de Gustavo Cardoso e edição de Tinta da China) se encontram reunidos, a par dos seus trabalhos “académicos dispersos” e das suas “reflexões de provedor”, vários “textos inéditos”.

Para Gustavo Cardoso, catedrático e investigador no ISCTE-IUL, Paquete de Oliveira conseguiu criar uma escola capaz “de pensar a Comunicação de forma diferente”, ou seja, “uma Sociologia da Comunicação com um olhar próprio”, integrando “contributos da Antropologia, da Sociologia, da Gestão, da Economia e da História”. Em causa, na opinião daquele sociólogo, um olhar (uma “compreensão”) diferente sobre a comunicação – “não apenas sobre o Jornalismo, mas sobre a comunicação como um todo”.

Em homenagem ao professor e jornalista que “se distinguiu na defesa das ciências da comunicação, dos princípios da transparência e da neutralidade no trabalho jornalístico, na defesa do respeito pelos cidadãos e pelas regras do pluralismo democrático nos meios de comunicação”, em 2018, o ISCTE-IUL, com o apoio do grupo PortoBay, criou o “Prémio Paquete de Oliveira”, com o objetivo de distinguir anualmente ensaios sobre os meios de Comunicação Social em Portugal.

 

Em debate realizado por ocasião do centenário             do Nacional da Madeira (2010), cuja comissão de honra integrou.
Em debate realizado por ocasião do centenário do Nacional da Madeira (2010), cuja comissão de honra integrou.